Normalmente não gosto de tratar as abordagens nas postagens de forma circunscrita. Prefiro fazer considerações genéricas, que cabem a qualquer situação, até porque muitos dos problemas são comuns à maioria das cidades, regiões e estados. Mas desta vez estarei tecendo considerações sobre Pernambuco, especificamente nossa Região Metropolitana do Recife.
O motivo são as recentes notícias sobre o aumento de tarifa no sistema metropolitano, incluindo Recife e Olinda, cidades que têm seu transporte municipal delegado ao Consórcio Metropolitano. De um lado, proposta de aumento na ordem de 14%, apresentada pelos empresários de transporte coletivo urbano, e de outro, o Governo (?) se posicionando contra esse patamar, dizendo que não irá aceitar, inclusive afirmando que não dará aumento.
O problema já começa com o posicionamento do Governo do Estado. Essa "tomada de posição" representa o que eu já questionava quando da criação do Consórcio Metropolitano, que substituiu a EMTU - Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos, essa sim, uma empresa pertencente ao Governo do estado de Pernambuco. Representa que, na prática, a concepção de um consórcio não vingou. Saiu a EMTU, entrou o Consórcio. Portanto, tomada de decisão pelo Governador já é um desvio de responsabilidades, as quais seriam do Consórcio e não do Governo, independente de participações percentuais na composição do Consórcio. Em outro momento abordarei sobre o Consórcio com mais detalhes.
Vale salientar que não é de hoje que se tomam decisões sobre a questão tarifária de forma POLÍTICA e não técnica. A posição do Governo de não aceitar o aumento é política. Para não se aceitar uma proposta de aumento tarifário tem que se questionar tecnicamente. Nós, usuários, sim, podemos e devemos questionar aumentos. Até porque, normalmente, não se tem transparência sobre esse cálculo. A abordagem sobre o VALOR da tarifa está errada. É superficial e não aborda os problemas do Sistema. Já disse em outras oportunidades que a tarifa (calculada corretamente) é efeito e não causa dos problemas. O Sistema convive com incongruências, inconsequências e planejamento não concluído. O BRT é um exemplo disso, não tendo sido executado completamente, sem contar os erros de planejamento e até mesmo de execução.
Cálculo de tarifa não é complicado. Mas envolve vários indicadores, adequados levantamentos dos custos e receitas e a devida fiscalização do cumprimento da programação, que irá definir esses custos. Essa fiscalização é negligenciada e o controle dos custos não é realizado. Mas esse cálculo reflete a situação do Sistema, com superposições, descontinuidades, terminais mal administrados, descontroles e uma rede mal dimensionada. Vale salientar que existe a tarifa pública, que é a cobrada à população e a tarifa que remunere os custos das operadoras. Nem sempre se consegue que as duas estejam no mesmo patamar. Aí entraríamos na questão do subsídio e do que realmente é transporte público, que não vou abordar neste artigo. A menos que haja subsídios adequados, quem paga a tarifa é o usuário, notadamente aquele mais desprovido de capacidade de pagamento, quando não está empregado ou é subempregado, não tendo o benefício do vale transporte.
No passado já se deixou de dar aumento como um benefício à população. Uma enganação com repercussões, hoje sentidas na deterioração do sistema de transporte coletivo. Dizer que "quer manter a tarifa local como uma das mais baratas do Brasil" é uma bravata. Irresponsabilidade já ocorrida no passado, como eu disse anteriormente. Como se diz popularmente, "não existe almoço de graça". Quando as empresas apresentam uma proposta de aumento, ela tem que ser discutida tecnicamente. Primeiro quanto à metodologia adotada, índices utilizados e correção na apropriação das informações relativas aos custos e receitas. Segundo, fazer uma discussão responsável sobre questões estruturais do Sistema. Inclusive as questões jurídicas de um processo licitatório de quase uma década, ainda não concluído e com uma série de problemas relativas ao equilíbrio econômico e financeiro.
Quando se faz essas bravatas, fica igual à famosa frase de um jogador que dizia: "eles fingem que pagam, a gente finge que joga". Em transporte coletivo é assim. O gestor faz seu discurso demagógico e as empresas fingem que cumprem o planejado. E quem sofre é a população.
Então essa questão do aumento de tarifas precisa ser melhor discutida e não com abordagens superficiais. A Lei Federal N.º 12.587/2012 que estabeleceu a Política Nacional de Mobilidade Urbana e determinou a obrigatoriedade da elaboração, pelos municípios, de Planos de Mobilidade Urbana, tendo o transporte coletivo como um dos focos, vem sendo desprezada pelos gestores municipais, sempre fazendo lobby para prorrogação do prazo, agora previsto para 2021, ou seja, 09 (nove) anos após a sanção da lei, se não for novamente prorrogada.
As tarifas de transporte coletivo são altas para a maioria da população. Mas a demagogismos podem ser muito mais prejudiciais. E sem uma discussão mais abrangente sobre aspectos estruturais da Mobilidade, leva à falta de planejamento do Transporte Coletivo. E as tarifas como reflexo.