No artigo “PAGAMOS CARO POR UM TRANSPORTE PÚBLICO QUE NÃO É PÚBLICO”, no qual discorremos sobre políticas de transporte e tarifária, dissemos que iríamos abordar a essência do cálculo tarifário, normalmente tratado como uma “caixa preta”. E muitas vezes essa assertiva realmente é uma realidade.
Antes de passarmos ao cálculo, considero importante fazer a transcrição do que trata a Lei N.º 12.587/2012, que estabelece a Política Nacional de Mobilidade Urbana. Eis o trecho relevante para este texto:
Art. 8o A política tarifária do serviço de transporte público coletivo é orientada pelas seguintes diretrizes:
I - promoção da equidade no acesso aos serviços;
II - melhoria da eficiência e da eficácia na prestação dos serviços;
III - ser instrumento da política de ocupação equilibrada da cidade de acordo com o plano diretor municipal, regional e
metropolitano;
IV - contribuição dos beneficiários diretos e indiretos para custeio da operação dos serviços;
V - simplicidade na compreensão, transparência da estrutura tarifária para o usuário e publicidade do processo de revisão;
VI - modicidade da tarifa para o usuário;
VII - integração física, tarifária e operacional dos diferentes modos e das redes de transporte público e privado nas cidades;
VIII - articulação interinstitucional dos órgãos gestores dos entes federativos por meio de consórcios públicos; e
IX - estabelecimento e publicidade de parâmetros de qualidade e quantidade na prestação dos serviços de transporte público
coletivo.
grifos nossos.
Vejam as diretrizes que DEVERIAM orientar a questão em nossas cidades. Mas vamos ao cálculo.
Tarifa é um cálculo simples. Em síntese, é a divisão do somatório de todos os custos, com tributos, pelo IPKe, que é o Indice de Passageiros por Quilômetro. O "e" é a média ponderada da quantidade de passageiros, pela sua respectiva tarifa, considerando que existem benefícios (descontos) e gratuidades no total de passageiros transportados.
T = Ctotal+tributos
IPKe
O Custo Total é formado pelos Custos Fixos e Custos Variáveis. A diferença é que os primeiros são aqueles que independem da operação, ou seja, não são proporcionais à quilometragem percorrida. Os Custos Variáveis, são diretamente proporcionais à forma da operaçao, sendo calculados em função da quilometragem executada, ao longo de um ano, geralmente.
Quem são os CUSTOS FIXOS? Despesas administrativas (água, luz, eventuais aluguéis, etc); Seguro de Responsabilidade Civil (quando são exigidos pelo Poder Público); Salários de pessoal operacional, administrativo e de manutenção; fardamentos; Gastos com taxas e impostos referentes aos veículos (IPVA, Licenciamento, etc); Outros (bilhetagem eletrônica, comercialização, etc). Normalmente surge um questionamento quanto a esses custos. Os usuários devem pagar por tantos gastos, alguns não diretamente ligados à operação? a resposta é sim. Em qualquer relação comercial, paga-se por custos não ligados diretamente ao produto ou serviço. São os custos "embutidos",
Considerado à parte ou como integrante dos Custos Fixos, temos o CUSTO DO CAPITAL, que é a Depreciação e a Remuneração de todo o capital envolvido na prestação do serviço de transporte público. A Depreciação, é considerada pois é necessária a valoração dos recursos necessários para a substituição, ao final de sua vida útil, dos bens de consumo durável (incluindo a frota) e das edificações, maquinários e veículos de apoio. E uma parcela da tarifa é para essa finalidade. A Remuneração corresponde ao valor do capital investido no negócio, no caso, transporte público. Ambos são calculados por fórmulas que levam em consideração preço de aquisição, vida útil (estabelecida pela regulamentação do serviço), valor residual (valor ao final da vida útil), participação de veículos dentro da vida útil, idade média da frota e taxa de remuneração estabelecida quando da contratação. São cálculos abrangentes, mas simples. As formas e fórmulas podem ser obtidas em bibliografia específica.
Os CUSTOS VARIÁVEIS, como foi dito, são proporcionais à quilometragem percorrida. São eles:
- Combustíveis e lubrificantes: são calculados em função de seus respectivos coeficientes de consumo, que podem ser obtidos por verificação do consumo real, caso a caso, ou por coeficientes médios. A conhecida planilha do GEIPOT é ainda hoje uma referência para se utilizar. Mas a sugestão é que cada cidade possa ter seus próprios coeficientes, pois são provenientes das próprias condições locais: temperatura, qualidade do sistema viário, topografia, congestionamentos, etc. A situação ideal é verificar esses custos. Inclusive sendo uma forma de verificar as empresas que melhor operam, do ponto de vista de redução de gastos, preocupação com consumo, etc
- Peças e Acessórios: Nas diversas planilhas em vigor no país, muitas utilizam coeficientes de proporcionalidade em relação ao consumo de combustível. Embora a situação mais exata seja a de se apontar os custos reais de manutenção dos veículos em peças e acessórios, por vezes, o próprio Poder Público não tem condições de aferir tais gastos.
- Pneus: Com a mesma consideração da questão das condições locais e do real consumo, normalmente são utilizados valores médios (considerados em planilhas nacionais) para a determinação da vida útil e reutilização (recapagem dos pneus).
Os Custos Variáveis já são calculados considerando a relatividade da quilometragem percorrida. Para se calcular o Custo Total, calcula-se o Custo Fixo também relativizando em relação à quilometragem. Somados os Variáveis e os Fixos, e considerados os tributos, tem-se o numerador da fórmula inicial.
O IPKe é um índice qualitativo dos Sistemas de Transporte. Representam o grau de otimização e da qualidade do atendimento, proporcionalmente à quilometragem, ligada diretamente aos custos. Quanto maior esse índice, melhor a operação, do ponto de vista da rentabilidade (a depender da tarifa de remuneração dos operadores). Esses índices têm piorado ao longo da última década em função da utilização dos modos individuais de transporte (carros, motos, bicicletas e até mesmo a pé), o que mostra a necessidade de uma política de mobilidade nacional e dos próprios municípios, para estabelecer as prioridades necessárias ao transporte coletivo, pois é a principal e mais justa forma de deslocamento das pessoas nas cidades.
O IPKe leva em consideração à política de tarifária e capacidade de gestão e fiscalização pelo Poder Público. Quanto maiores os benefícios e gratuidades estabelecidos, maior será a tarifa. Maior para quem paga. Empregadores e usuários que não têm o vale transporte.
Com o Custo Total e o IPKe, tem-se a tarifa. Mas cabe a pergunta: Quais são os elementos que podem se constituir em "armadilhas" para o Poder Público, Operadores e Usuários?
Na próxima postagem apresentaremos esses pontos que podem representar uma "Caixa Preta".
Até a próxima !!!
Artigo by Ivan Carlos Cunha
Diretor de Consultoria e Engenharia da TCE
www.tceconsultoria.com
Artigo by Ivan Carlos Cunha
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