segunda-feira, 31 de agosto de 2020

VOCÊ É "MATÉRIA PRIMA" PARA A INDÚSTRIA DA MULTA?

Possuo grandes preocupações, e destas, manifesto “uma” com mais frequência.

É o uso disseminado da frase:
- A “Indústria da multa”; (que confio não ser absolutamente correta)
 

Consciente da quantidade enorme de condutores, que desrespeitam as normas de trânsito - tanto nas vias públicas como nas estradas, rotulo esta rebelião de legítima e autêntica “crendice popular”.
 
E assumindo a liberdade da vontade, pergunto ao leitor:
- De que maneira o “agente fiscalizador” pode alterar o valor da velocidade que aparece digitalmente – após focalizar seu veículo, no equipamento denominado “radar”? (também sabemos que eles devem ser constantemente aferidos)

- Que procedimento o “agente fiscalizador” usaria para trocar uma placa de sinalização na via, onde se identifica “permitido estacionar” para “proibido estacionar”, em instantes, enquanto você vai à farmácia, por exemplo?

Mas você utiliza aquelas desculpas do “tempo do ginásio”:
- A placa não estava aí!
- Não vi!
- Não sabia!
- Foi só por um tempinho!...
...e outras asneiras.
 
- E os equipamentos chamados de “pardais” – que fornecem a “foto” do seu carro? 
... será que sempre indicarão valor de velocidade diferente da que o veículo realmente estava? (seria fácil demais para ser verdade)
 
- E ao receber “autuação” por não cumprir as normas de trânsito? ... são todas injustas? (se a resposta for afirmativa cabe “recurso”, pois é dever do cidadão denunciar a injustiça em toda parte. Você sabia?)
 
Dispomos muitas vezes dos mesmos objetivos sem partilhar dos mesmos princípios, mas você deve concordar que é necessário pensar nestas indagações. (mesmo que agora esteja com o “tacape de guerra” erguido no ar)
 
Nós humanos, não somos muito diferentes uns dos outros. O estilo de vida, o que pensamos e como funcionamos, está refletido na maneira pela qual nos comportamos no trânsito.
 
Somos no trânsito, o que somos no íntimo! E aqui cabe o aspecto da índole, do sentimento, da maneira de pensar, e por fim...
 ...das atitudes.
 
Levamos para “rua” o que está dentro de nós, e não há como mascarar...
 
Consequentemente o objetivo de alguns “pousa” no campo de “levar vantagens”, e jamais o de “arcar com os seus delitos”.
 
Como já se sabe – e isso há bastante tempo, muitos ainda se colocam naquele compartimento que faz moradia longe da coletividade. (isso gera no cidadão a falta de gentileza urbana)
 
A “imprudência”, seguramente reina como a principal causa dos denominados “acidentes” de trânsito, e o alerta mundial – que há tempos disparou –, é que ou abrimos os olhos ou acabaremos mortos...
 
O “imprudente” sempre é perigoso para uma sociedade mesmo que viva recluso em um lugarejo isolado.
 
Singularmente detenho oposição ao termo “acidente”, pois a palavra tende a “mascarar” os reais motivos envolvidos. (são como derrapagens inoportunas)
 
Considero “acidente” um acontecimento inesperado, sempre indesejável e que ocorre de modo não intencional...
...provocando danos pessoais, materiais e financeiros. (onde a NEGLIGÊNCIA jamais está presente)
 
No “acidente”, não há responsáveis porque o acontecimento foi imprevisível, ou até muito pouco provável.
 
Não acham que é o momento de conspirar contra o mau exemplo e iniciar a falar correto?
 
Vamos lá...
 
Acidente é...
... o seu veículo ser atingido por um raio no meio da “via”, incendiar e você morrer tostado.
 
Acidente é...
... ocorre alguma falha mecânica involuntária e há colisão com outro veículo.
 
Acidente é...
... o motorista do coletivo - com “recomendada” saúde – conduzindo o veículo sofre um “infarto”,
e assim desgovernado ocasiona atropelamentos...
 
NO “ACIDENTE” VOCÊ NÃO INTERFERE INTENCIONALMENTE NO EVENTO!
 
Estar com pressa, bebidas alcoólicas junto à condução de veículos, achar que a via pública é de sua exclusividade, o excesso de confiança do condutor em si mesma e na potência do motor do veículo, e as ações equivocadas dos condutores são as variáveis perfeitas para a composição da fórmula de colisões e mortes no trânsito.
 
É ingenuidade e desconhecimento, acreditar que seja fácil a tarefa de combater as causas das imprudências.
 
Longe disso.
 
Conhecem o ditado de que “uma andorinha não faz verão”?
 
Pois bem, se diz o mesmo das campanhas de conscientização para a mobilidade urbana. Sozinhas elas não trazem resultados imediatos... (para falar a verdade, penso que ficam distantes da eficácia)
 
Entendem onde quero chegar?
- Exato; aí mesmo onde você pensou.
 
Estou falando das instalações de fiscalização eletrônicas, dos radares, das lombadas umas próximas a outras, das blitze, dos agentes de trânsito fiscalizando etc.
 
E qual o motivo desse batalhão de zeladores?
- Penso que é para ajudar aqueles que não sabem conviver em sociedade.
(os denominados “eremitas urbanos”)
 
Agora pensem comigo...
Quando uma criança faz algo de errado, qual a obrigação dos responsáveis por ela?
- Sim, é corrigir; pois isto é parte importante na “Educação”.
 
De que maneira?
- Fornecendo alternativas para que “ela” compreenda o que é possível, e o que não é aconselhável.
 
Então, para um adulto que comete irregularidades, ao contrário de colocá-lo de castigo no quarto, (pois só isto não funcionaria)
...em troca, você subtrai aquilo que “ele” aprecia.
 
Concorda?
Por isso se cometeu delito, em troca o condutor terá a ausência do que prioriza muito.
 
Justo?
Na criança sabemos que é a restrição no uso do “aparelho eletrônico”, e no adulto – sem muito tempo a perder – é...
...o citado “mexer no bolso”. (Particularmente acho esse termo “inexato” e “ignorante”)
 
Básico, simples e de eficácia enorme...
...só que tristonho.
 
Consequentemente, se o “imprudente” não deseja perder o que faz feliz, resta comportar-se bem.
 
E por mais insano que pareça, (pois implica a segurança dos outros), sou a favor de que o motorista tenha sempre, a sensação de que é vigiado...
 
Lembra o motivo pelo qual o professor na escola cuida a “avaliação” usando óculos escuros?
- Recordou?

 Sim, é patético, mas necessário...
...ou você diria que igualmente existe a “Indústria do não deixar colar” nas Escolas, da qual a matéria prima todos sabemos é o aluno desonesto?
 
OBS: Cabe complementar que nenhuma indústria funciona sem “matéria prima”.
 

Artigo by ACESAR VEIGA

Químico e Ativista da Mobilidade Urbana de Porto Alegre/RS



domingo, 5 de julho de 2020

TRANSPORTE ATIVO: ALTERNATIVA EMERGENCIAL OU PARTE DE UMA POLÍTICA ?

Como foi apresentado no artigo anterior, em algumas cidades foram adotadas ações voltadas ao Transporte Ativo, com a ampliação de ciclovias como alternativa de deslocamentos, visando enfrentar os desafios ao  Sistema de Mobilidade, impostos como consequência da pandemia pelo Coronavírus. O isolamento social estabelecido, com a adoção de protocolos impondo a limitação de quantidade de passageiros em veículos de transporte coletivo, fez com que alguns gestores buscassem no transporte ativo, notadamente o cicloviário, como uma alternativa.

Mas aí fica a pergunta: Essas ações farão parte de uma alternativa emergencial ou serão parte de uma política consistente de incentivo ao transporte ativo?


O mundo no pós-pandemia deverá ser outro. Ao menos por um bom período, considerando-se que o ciclo natural de contágio, como qualquer outro, é passível de novas levas de casos, além dos diferentes momentos de pico nas cidades. Isso tudo estará levando à possibilidade de mudanças de comportamento e principalmente temores de novos contágios por parte da população. E por menor que seja o percentual de pessoas que evitem o transporte coletivo, trará consequências para a mobilidade urbana. 

Uma delas, num primeiro momento, será o aumento da utilização do transporte individual, o que com a volta gradual dos deslocamentos das pessoas, será um complicador para a circulação nas vias, pois a grande utilização de automóveis e motos, trazem, invariavelmente, como consequência, os congestionamentos. Essa "disputa" entre o transporte coletivo e o individual é, historicamente, um dos maiores problemas da mobilidade nas cidades.

O contraponto a essa disputa é o transporte ativo, definido na própria Política Nacional de Mobilidade, definida pela Lei 12.587/2012, como algo, juntamente com o transporte coletivo, que deve ser priorizado pelas gestões municipais. E justamente por isso, é que a resposta à pergunta do título é que o transporte ativo deve ser parte da Política de Mobilidade, nas cidades. 

O Transporte Ativo, além de ser uma excelente forma de se propiciar deslocamentos saudáveis à população, tem que estar integrado no conjunto de soluções de mobilidade. E quando digo integrado, falo literalmente. Principalmente com o transporte coletivo.

Ciclovias, bicicletários, compartilhamento de bicicletas, são soluções necessárias à essa integração. Começando pela disponibilidade de ciclovias, devidamente concebidas, protegendo os usuários e possibilitando o acesso a comércio, terminais de transporte coletivo e equipamentos públicos, como escolas, hospitais, dentre outros. Os bicicletários possibilitam a inserção da bicicleta aos pontos de interesse nos deslocamentos. E o compartilhamento de bicicletas é a forma de propiciar maior uso pelas pessoas, democratizar a oferta como serviço e até mesmo incentivar a utilização. Isso sem contar a utilização no transporte de cargas, notadamente de entregas. O cenário da logística de entregas envolve a crescente utilização de bicicletas.  

Para que isso ocorra os gestores dos municípios precisam investir no planejamento da mobilidade, que a Lei já determina que seja implementado através da elaboração dos planos de mobilidade urbana. E que esses planos estejam também integrados aos planos diretores e a eventuais estudos específicos de propostas cicloviárias, que aliás não deveriam ser feitos de forma isolada, mas dentro da política para a mobilidade, mas não como um apêndice, mas como uma das prioridades. 

Além disso, o planejamento do transporte ativo também precisa prever a potencialização das condições do deslocamento a pé, com a melhoria dos padrões construtivos de calçadas, sua manutenção e seguindo as exigências legais quanto à acessibilidade, muitas vezes exigida para os veículos de transporte coletivo e desprezada no espaço viário destinado à circulação de pedestres. 

Outrossim, diante do crescimento do interesse pela utilização das bicicletas, aumentando o número de usuários, de uma análise do perfil desses usuários verificando-se até mesmo a situação de vulnerabilidade social de parte desses usuários, há a necessidade de se investir na Educação de Trânsito, com foco no usuário de bicicleta. Muitos deles não são habilitados e desconhecem a legislação de trânsito, seus direitos e deveres, e a importância do auto reconhecimento como agente ativo da mobilidade urbana.

Como pode ser observado, há muito por fazer para integrar a bicicleta na Política de Mobilidade Urbana. E aproveitando o momento eleitoral, a sociedade precisa cobrar o compromisso de atuais e futuros gestores e legisladores quanto à questão, cobrando a elaboração de Planos de Mobilidade Urbana, tendo o Transporte Ativo, juntamente com o Transporte Coletivo, como prioridade.

quinta-feira, 2 de julho de 2020

NOVOS CENÁRIOS PARA A MOBILIDADE URBANA

Pode parecer repetitivo, mas neste artigo vou tratar novamente de cenários para a Mobilidade Urbana, frente à pandemia gerada pela doença Covid-19, assim como fiz no artigo anterior. Só não coloquei o mesmo título (2/2) por razões estéticas. Mas o tema é o mesmo, dada a relevância para uma das atividades mais importantes nesta retomada da vida "normal".



Importante destacar que essa retomada, entre os estados do Brasil, ou mesmo entre cidades e regiões de um mesmo estado, vai se dar em formatos diferentes, sendo que em alguns locais, como foi em Porto Alegre, poderá haver a ocorrência "novas ondas" de casos dessa doença pandêmica, portanto não há "receita pronta" quanto às medidas a serem adotadas nesse novo momento.

Também vale ressaltar, como de praxe, não há qualquer interesse em entrar na questão ideológica que, infelizmente, vem norteando as discussões acerca do problema e suas causas. O objetivo, é discutir os efeitos.

Tive a oportunidade de participar, como ouvinte, em 02.07, convidado por um professor da Universidade Federal de Pernambuco, de uma reunião com representantes de cidades como Madrid, Porto Alegre, Belo Horizonte, Goiânia, Fortaleza, Vitória, dentre outras, onde os gestores dessas localidades explanaram um pouco o que ocorreu, o que fizeram e o que esperam daqui por diante. Vou tentar resumir, não particularizando, essas informações.

Antes, um preâmbulo sobre os sistemas de transportes, notadamente o coletivo, primordiais para o conjunto de situações que envolvem a Mobilidade Urbana. Já estavam, antes da pandemia, em situação complicada do ponto de vista da sustentabilidade do setor. Por vários aspectos, que aqui neste texto, não há condições de aprofundar, mas cito alguns: 
  • Ausência de Planejamento da Mobilidade Urbana, envolvendo a concepção de novas redes e sistemas. Muitas cidades ainda não elaboraram seus Planos de Mobilidade Urbana, exigência da Lei 12.587/12, que instituiu a Política Nacional de Mobilidade Urbana;
  • Falta de investimentos no Transporte Público Coletivo, o qual atende à cerca de 70% da população (lembram da CIDE?);
  • O modelo de remuneração das operadoras de transporte, baseado, com raras exceções, na tarifa pública, ou seja, quem remunera as empresas é o próprio usuário direto, ou empregadores, adquirentes do vale transporte aos seus funcionários; 
  • A dificuldade de se promover a prioridade a esse importante modal de transporte, ou mesmo a incapacidade e/ou falta de vontade de gestores públicos (sem generalizar, obviamente) e até mesmo por não ser o objeto de interesse de parte da sociedade, principalmente dos formadores de opinião;
  • Incapacidade de gestão, pelo Poder Público, dos sistemas. Muitos com irregularidade na delegação das permissões para as empresas, pois não houve licitação, exigência legal para essa delegação;
  • Redução gradativa da demanda de passageiros, pelo advento de novos usos e costumes, tecnologias e realidades, tais como o transporte remunerado individual, mas também pela falta de capacidade de pagamento da população.
  • Dentre outros (muitos outros!)


Passemos a alguns relatos nos locais supracitados. 

Grosso modo, houve uma grande redução de serviços durante os últimos meses, obviamente por conta da restrição de circulação de pessoas nas cidades, medidas de redução das atividades, ou mesmo pelo recolhimento voluntário das pessoas às suas casas. Em média, houve uma redução de 70% da já combalida demanda de passageiros e redução não proporcional da frota em operação, em muitos casos, esses veículos parados sendo parte de financiamento, portanto ainda sendo pagos.

Os custos de operação diminuíram, face à diminuição dos congestionamentos, permitindo menos frota alocada para suprir as programações horárias, porém os custos fixos, em contraponto, pouco foram alterados, implicando em dificuldades financeiras das empresas. Houve redução de quadros, por conta de redução no fator de utilização referente ao pessoal de operação, e de cobradores, pois, em alguns casos, passaram a operar sem aceitar pagamentos em espécie, ou sem os mesmos, apesar do agravamento do problema social, e dos custos com essas demissões. Algumas cidades só permitiram os ônibus saírem dos principais terminais com passageiros sentados, mas com dificuldades de se controlar isso nos terminais de subúrbios. Além disso se investiu em treinamento para esses novos comportamentos pelos funcionários.

Por outro lado, houve a necessidade em investimentos em limpeza e produtos de higiene, proteção individual e coletiva para funcionários e passageiros. Houve até mesmo redução de funcionários, por enquadramento nos grupos de riscos e por doença e falecimento. Houve também investimentos em testes para identificar a doença, com aplicações periódicas.

Mas talvez o mais importante foram os relatos das experiências e ações implementadas e algumas propostas para revisão das práticas de "atendimento" à população (vamos ver se isso vai se realizar mesmo). Foram os seguintes relatos:

  • Determinação da redução da taxa de ocupação nos veículos, inicialmente por conta da necessidade do isolamento social, mas, em algumas cidades com a promessa de isso se estender por alguns meses, mesmo após a retomada da dita normalidade. Esse, sem dúvida, é um dos principais problemas do transporte, pois, invariavelmente é a maior reclamação dos usuários e principal fator de não atratividade para utilização do transporte coletivo. A ressalva é como isso irá se traduzir na relação receitas-custos.
  • Aumento de faixas exclusivas para transporte coletivo, algumas implantadas durante a pandemia, facilitada pela diminuição de veículos nas ruas, possibilitando a execução de maneira mais célere. Por mais questionada que possa ser, essa ação é parte da pretendida prioridade ao transporte coletivo, como uma Política Pública. A parcela da população, usuária do transporte individual, estará sempre refratária a essa ideia, mas não há outra saída para otimização da operação do modal coletivo, e principalmente para oferta de qualidade. Lembrando que o modal coletivo transporta cerca de 70% da população nas grandes cidades.
  • Foi relatado por um dos gestores, que num dos estados o governo fez um acordo com o setor e passou a adquirir todo o diesel, diretamente à produtora de combustível, reduzindo em 40% o custo para o Sistema, pois devido à escala de compra, conseguiu essa relevante redução. Outros locais, praticaram a desoneração de impostos referente ao combustível para o transporte coletivo.
  • Negociação com setores de produção, a partir do momento de retomada dos serviços, para flexibilização de horários visando promover o espraiamento dos horários de pico, ou seja, reduzindo o impacto gerado nesses horários, onde, por conta da redução da velocidade comercial dos veículos de transporte coletivo, que por falta de prioridade ficam "disputando" espaço com os veículos particulares, geram maior alocação de frota para cumprir a mesma quantidade de viagens em relação aos horários onde o volume de tráfego é menor. Como exemplo foi a construção civil iniciando suas atividades a partir de 9h. Isso diminui necessidade de frota, ou permite a melhoria no atendimento. Ou ambos, conforme o caso. Essa medida tem consequência na diminuição do custo e/ou possibilidade de melhoria no atendimento.
  • Incentivo ao transporte Ativo: a pé e bicicletaAmpliação da malha cicloviária, inicialmente com ciclovias emergenciais, mas para garantir o isolamento social, mas como uma alternativa à mobilidade urbana. Ampliação e incentivo ao uso de bicicletas compartilhadas. Aumento na infraestrutura: bicicletários, integração com transporte coletivo, etc.
  • Com base na MP 936, onde foi criado o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, possibilidade de redução de salários, consequentemente dos custos do Sistema. Essa medida, juntamente com outras, voltadas à redução de custos, propiciou a redução da tarifa técnica, ou seja, a tarifa de remuneração necessária, diminuindo o prejuízo.

Alguns desses gestores apresentaram ainda propostas para o Setor:

  • Criação do Sistema Único de Mobilidade, com o incremento de investimentos no Transporte Público Coletivo, como forma de reduzir o modelo de remuneração perverso com os usuários, uma vez, como dissemos, na maioria dos sistemas são eles quem remuneram os custos das empresas, através da tarifa pública, e insuficientes para as empresas, pois nem sempre a tarifa técnica (a necessária para cobrir os custos) é aplicada, e sim a tarifa pública (muitas vezes por conveniência política, às vezes até negado o aumento, por conta dessa conveniência).  
  • Ampliação de receitas, para o Sistema, não necessariamente as empresas, através de instrumentos de equilíbrio de responsabilidades e financiamento do Transporte Público Coletivo, com a adoção de taxas ou outras formas de sustentabilidade a esse modal. Foi sugerida a "Tarifa de Congestionamento", que nada mais é do que um pedágio urbano, assim como acontece em grandes cidades de Europa.
  • Aumento do financiamento do Vale Transporte, como forma de subsídio ao Transporte Coletivo, estabelecendo que, através da adesão de empresas, com a implantação de um desconto compulsório em folha de todos os funcionários, e não somente os usuários do vale transporte, permitindo, em contrapartida, que todos os funcionários tenham acesso gratuito ao transporte coletivo. Isso reduziria o valor pago pelos funcionários de menor renda e ainda podendo promover a inserção de novos usuários no transporte coletivo, uma vez que já teriam valores descontados no salário. Meio impositiva, mas foi uma proposta colocada.
  • Investimento no Transporte Ativo, possibilitando a ampliação da malha cicloviária, como alternativa, inclusive sadia, de deslocamento das pessoas.
  • Avaliação da prestação do serviço, com mudança de paradigmas, muito planejamento (lembro a importância das cidades elaborarem seu Plano de Mobilidade Urbana); investimentos em tecnologia e inovação voltados à prestação do serviço, fiscalização, controle, facilidade de acesso e melhoria da qualidade.

Estão aí colocadas algumas das sugestões. Obviamente há a necessidade de uma ampla discussão. Mas é exatamente isso que se faz necessário, discutir políticas públicas com a sociedade, envolvendo-a nos problemas, de forma transparente e objetiva, na busca de soluções coletivas para a melhoria da qualidade de vida de todos.

Foi consenso que, tudo o que vem ocorrendo serve de aprendizado, que acelere o "debruçar" sobre os problemas em busca dessas soluções. E a perspectiva é que tenhamos uma outra forma de utilizar as cidades, notadamente com a visão da importância dos transportes coletivos e ativo, havendo a necessidade da união da sociedade para transformar essas cidades em espaços mais humanos, democráticos e sustentáveis.

Ideia que eu comungo.

Desculpem pelo texto excessivamente longo. Mas o tema e quantidade de informações assim o exigiram.


Artigo by IVAN CARLOS CUNHA

     

segunda-feira, 4 de maio de 2020

"COMO SERÁ O AMANHÃ?" (PARA A MOBILIDADE URBANA)

Uma das questões que tem sido objeto de várias tentativas de análise de quem pensa e trabalha com cenários é, pegando um trecho de uma famosa música, "COMO SERÁ O AMANHÃ?".



Esse humilde Consultor vai tentar discorrer um pouco sobre os cenários para a Mobilidade, concatenados com uma visão mais abrangente, que envolve aspectos sociais, sociológicos e, principalmente, econômicos.

Muito se fala numa mudança de postura da população em relação aos hábitos e costumes ligados à questão de higiene. Acredito que, num primeiro momento, quando a vida no País voltar à "normalidade", as pessoas, de forma geral, vão manter essa maior atenção a essas, por hora, obrigações: lavar as mãos, ter mais cuidados com utilização de objetos e procedimentos, etc. Mas, naturalmente, aos poucos isso irá se perder com o tempo. Com raras exceções.

Comecei pela questão da higiene e essa loucura que se transformou a orientação e até mesmo obrigação das pessoas terem novos hábitos, porque fui instado a falar sobre o que poderá acontecer, por exemplo, na utilização dos veículos de transporte, notadamente coletivo - ônibus e metrôs. Como as pessoas irão se posicionar, se continuarão a utilizá-los, procedimentos, posturas e cuidados. Minha resposta a esse interlocutor foi na linha do que já foi dito acima. Num primeiro momento, temor, cuidados e profilaxia. Depois esse medo vai se esvair. Mas não pode ser desprezada a possibilidade de haver redução da utilização do já combalido transporte coletivo, até hoje decorrente de várias situações: falta de qualidade, falta de capacidade de pagamento, novas opções/tecnologias, novas prioridades etc. E isso precisa ser melhor estudado, observar o que vai acontecer em países onde a volta à normalidade vai acontecer antes do Brasil, com o fim do isolamento social. O comportamento dessas populações poderá servir de referência para o que poderá ocorrer no nosso País. Muitos poderão imaginar que utilizando o transporte individual estarão menos sujeitos à contaminação. As consequências do apelo sociológico sobre o uso do transporte individual, nossas cidades já conhecem há décadas.

Por outro lado, nada impede que gestores públicos e operadores do transporte, mantenham alguns cuidados que (alguns) operadores estão tomando. No Brasil, a questão da higiene nos veículos de transporte coletivo sempre foi deixada à margem das preocupações/ações, por esses atores. E isso precisa mudar. Vale salientar que a NTU - Associação Nacional de Empresas de Transportes Urbanos, em sua página principal tem uma série de recomendações, inclusive para os usuários, além das orientações comuns, evitar pegar os veículos no horário de pico e manter as janelas abertas, por exemplo. A observação é que parte da frota de ônibus precisaria de modificações nas suas estruturas, pois há vários modelos de janelas onde a abertura é apenas na parte superior, principalmente os ônibus com ar condicionado. Vai requerer investimentos do setor.

Por falar no setor, a própria NTU apresenta uma preocupação com a situação financeira das empresas, muitas em situação bastante complicada. Basta observar que a considerável redução de passageiros, consequentemente de receita, não as exime de arcar com seus custos fixos e parcelamentos e encargos referente a aquisição de veículos, por exemplo. O Ministro da Economia abordou o assunto, ciente da necessidade, inclusive, de apoio e de alternativas para manter o equilíbrio econômico e financeiro do setor. Isso faz lembrar da famosa CIDE - Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Lei Nº 10.336/2001), criada dentre outras coisas, para subsidiar o Transporte Coletivo, notadamente suas infraestruturas. Nada ou quase nada do que foi arrecadado foi investido com essa finalidade. Foi utilizado para "rechear" o superávit primário em governos anteriores.

As incertezas ainda pairam e dificultam qualquer análise sobre esse "Amanhã". Mas uma coisa é certa. Transporte Coletivo sempre será a solução para uma Mobilidade Saudável em nossas cidades. E não pode ser custeado, essencialmente, pela tarifa paga pelos usuários. E a necessária gestão, a partir da vivência presente, atenta aos cenários futuros, precisa ser foco de gestores públicos, operadores e da sociedade como um todo.



Artigo by IVAN CARLOS CUNHA

quinta-feira, 30 de abril de 2020

MANUTENÇÃO DE VIAS URBANAS: UM EXEMPLO DE FALTA DE GESTÃO

Hoje o assunto é uma questão que afeta a maioria das nossas cidades: a manutenção de vias urbanas.

Como preâmbulo, fica o registro que a mobilidade urbana não se faz apenas com a disponibilidade de vias, ou apenas a ampliação do sistema viário, como muitos pensam. A história mostra que essa lógica não é solução. A solução passa por um adequado planejamento urbano, uma política de deslocamentos que não deve ser forjada na prioridade ao transporte individual e, principalmente, no investimento no transporte coletivo. Essas premissas são essenciais para a construção de uma mobilidade urbana saudável. Mas, uma das bases para essa construção é uma adequada infraestrutura viária. É esse o foco deste artigo.

Muitos são os problemas verificados nas vias de nossas cidades. Tudo começa com algo com a ausência de planejamento urbano, ou mesmo um planejamento inadequado, que determinam sistemas viários não funcionais. Isso sem falar na falta de controle urbano, que também não terá foco neste texto, mas que impactam e reduzem a funcionalidade das vias, com avanços de construções em áreas públicas, que deveriam ser calçadas.

Mas voltando à questão da manutenção das vias, aí incluídas as calçadas. É questionável a qualidade dos pavimentos e recomposição dos mesmos pelas prefeituras. Chega a ser revoltante ver o desleixo com que é tratada a manutenção, muitas vezes a custos elevados, notadamente após o período de chuvas mais intensas, onde por problemas de drenagem, soluções técnicas inadequadas e baixa qualidade dos materiais empregados, obriga essas prefeituras a fazerem a famosa “operação verão”, que nada mais é uma manutenção decorrente dos problemas já elencados. Quero destacar, como exemplo de desleixo, obras de recapeamento, onde as tampas de poços de visita de redes fluviais, ou mesmo de outros serviços, ficam desniveladas, como no conjunto de fotos abaixo. É inadmissível esse desleixo, para não dizer outra coisa. A Engenharia brasileira dispõe de capacidade técnica, de profissionais e tecnologia para evitar isso. Só falta uma gestão adequada. Além disso, compromete a drenagem. A declividade da pavimentação é desconsiderada, o que vai suscitar uma rápida depreciação, por ocasião da presença de chuvas. Essa situação prejudica a todos os usuários, inclusive do transporte coletivo urbano.



Outro problema é a total incompatibilidade dos cronogramas de manutenção com operadores, públicos e privados, de outros serviços como fornecimento de água e rede de esgoto, empresas de telefonia, dentre outras, que fazem intervenções no sistema viário para realizarem seus serviços e deixam esses locais ou sem a recomposição do pavimento, ou fazem uma recomposição de péssima qualidade. Não raramente se observa um jogo de “empurra” sobre a responsabilidade pela recomposição do pavimento entre uma dada prefeitura e essas empresas de serviços. O resultado é pavimento mal feito, inadequado e até mesmo com comprometimento estético.

Mas a responsabilidade é do gestor municipal. Responsabilidade de realizar com competência, responsabilidade com o bem coletivo e com o erário público e capacidade de interlocução técnica, e até mesmo jurídica com essas instituições de serviços públicos. População, órgãos de fiscalização e até mesmo profissionais da Engenharia têm que se engajar na cobrança dos gestores municipais. E as eleições municipais estão por vir. Coloquemos esse questionamento a esses gestores.


Artigo by IVAN CARLOS CUNHA

terça-feira, 14 de janeiro de 2020

TARIFAS DE ÔNIBUS NA REGIÃO METROPOLITANA DO RECIFE - ABORDAGEM EQUIVOCADA

Normalmente não gosto de tratar as abordagens nas postagens de forma circunscrita. Prefiro fazer considerações genéricas, que cabem a qualquer situação, até porque muitos dos problemas são comuns à maioria das cidades, regiões e estados. Mas desta vez estarei tecendo considerações sobre Pernambuco, especificamente nossa Região Metropolitana do Recife. 

O motivo são as recentes notícias sobre o aumento de tarifa no sistema metropolitano, incluindo Recife e Olinda, cidades que têm seu transporte municipal delegado ao Consórcio Metropolitano. De um lado, proposta de aumento na ordem de 14%, apresentada pelos empresários de transporte coletivo urbano, e de outro, o Governo (?) se posicionando contra esse patamar, dizendo que não irá aceitar, inclusive afirmando que não dará aumento. 



O problema já começa com o posicionamento do Governo do Estado. Essa "tomada de posição" representa o que eu já questionava quando da criação do Consórcio Metropolitano, que substituiu a EMTU - Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos, essa sim, uma empresa pertencente ao Governo do estado de Pernambuco. Representa que, na prática, a concepção de um consórcio não vingou. Saiu a EMTU, entrou o Consórcio. Portanto, tomada de decisão pelo Governador já é um desvio de responsabilidades, as quais seriam do Consórcio e não do Governo, independente de participações percentuais na composição do Consórcio. Em outro momento abordarei sobre o Consórcio com mais detalhes.

Vale salientar que não é de hoje que se tomam decisões sobre a questão tarifária de forma POLÍTICA e não técnica.  A posição do Governo de não aceitar o aumento é política. Para não se aceitar uma proposta de aumento tarifário tem que se questionar tecnicamente. Nós, usuários, sim, podemos e devemos questionar aumentos. Até porque, normalmente, não se tem transparência sobre esse cálculo. A abordagem sobre o VALOR da tarifa está errada. É superficial e não aborda os problemas do Sistema. Já disse em outras oportunidades que a tarifa (calculada corretamente) é efeito e não causa dos problemas. O Sistema convive com incongruências, inconsequências e planejamento não concluído. O BRT é um exemplo disso, não tendo sido executado completamente, sem contar os erros de planejamento e até mesmo de execução.

Cálculo de tarifa não é complicado. Mas envolve vários indicadores, adequados levantamentos dos custos e receitas e a devida fiscalização do cumprimento da programação, que irá definir esses custos. Essa fiscalização é negligenciada e o controle dos custos não é realizado. Mas esse cálculo reflete a situação do Sistema, com superposições, descontinuidades, terminais mal administrados, descontroles e uma rede mal dimensionada. Vale salientar que existe a tarifa pública, que é a cobrada à população e a tarifa que remunere os custos das operadoras. Nem sempre se consegue que as duas estejam no mesmo patamar. Aí entraríamos na questão do subsídio e do que realmente é transporte público, que não vou abordar neste artigo. A menos que haja subsídios adequados, quem paga a tarifa é o usuário, notadamente aquele mais desprovido de capacidade de pagamento, quando não está empregado ou é subempregado, não tendo o benefício do vale transporte. 

No passado já se deixou de dar aumento como um benefício à população. Uma enganação com repercussões, hoje sentidas na deterioração do sistema de transporte coletivo. Dizer que "quer manter a tarifa local como uma das mais baratas do Brasil" é uma bravata. Irresponsabilidade já ocorrida no passado, como eu disse anteriormente. Como se diz popularmente, "não existe almoço de graça". Quando as empresas apresentam uma proposta de aumento, ela tem que ser discutida tecnicamente. Primeiro quanto à metodologia adotada, índices utilizados e correção na apropriação das informações relativas aos custos e receitas. Segundo, fazer uma discussão responsável sobre questões estruturais do Sistema. Inclusive as questões jurídicas de um processo licitatório de quase uma década, ainda não concluído e com uma série de problemas relativas ao equilíbrio econômico e financeiro.

Quando se faz essas bravatas, fica igual à famosa frase de um jogador que dizia: "eles fingem que pagam, a gente finge que joga". Em transporte coletivo é assim. O gestor faz seu discurso demagógico e as empresas fingem que cumprem o planejado. E quem sofre é a população.

Então essa questão do aumento de tarifas precisa ser melhor discutida e não com abordagens superficiais. A Lei Federal N.º 12.587/2012 que estabeleceu a Política Nacional de Mobilidade Urbana e determinou a obrigatoriedade da elaboração, pelos municípios, de Planos de Mobilidade Urbana, tendo o transporte coletivo como um dos focos, vem sendo desprezada pelos gestores municipais, sempre fazendo lobby para prorrogação do prazo, agora previsto para 2021, ou seja, 09 (nove) anos após a sanção da lei, se não for novamente prorrogada. 

As tarifas de transporte coletivo são altas para a maioria da população. Mas a demagogismos podem ser muito mais prejudiciais. E sem uma discussão mais abrangente sobre aspectos estruturais da Mobilidade, leva à falta de planejamento do Transporte Coletivo. E as tarifas como reflexo.


Artigo by IVAN CARLOS CUNHA

terça-feira, 7 de janeiro de 2020

FIM DE UM CICLO !!!

Amigos e clientes, 

A partir de hoje não faço mais parte do corpo diretivo da MODUS CONSULTORIA.

Continuarei com as atividades de Consultoria, nas áreas de Mobilidade, Engenharia e Gestão, além de uma série de cursos, como parceiro de algumas instituições, inclusive a própria MODUS, que passa a ser comandada pelos amigos Francisco Tavares De Melo Viana e Paulo Lustosa.

Meus contatos permanecem os mesmos, acrescido de um site onde divulgarei minhas atividades, artigos e demais informações: www.ivancarloscunha.eng.br 

O site já está no ar, restando apenas algumas complementações.



Obrigado a todos da MODUS e vamos em frente !!!

TARIFA ÚNICA: AVALIAÇÃO, DESAFIOS E PERSPECTIVAS

Tarifa Única no Sistema de Transporte Coletivo da Região Metropolitana do Recife - RMR. Embora seja um tema local é um assunto que é pauta e...